Menção Honrosa António Torrado
Uma Casa É Uma Montanha É Um Chapéu
Escritora: Filipa Tomaz e Letícia do Carmo | Ilustradora e Design Gráfico: Yara Kono
Acessibilidade e concepção táctil: Fátima Alves
Editora: Trienal de Arquitectura de Lisboa | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 38
Resenhista: Rita Pimenta
Concebido para ser acessível a crianças cegas ou com baixa visão e às que vêem bem, este álbum ilustrado táctil explora diferentes formas de pensar “a casa”. Dentro e fora. É um livro para ler e ver (também) com os dedos.
Numa linguagem simples, explora-se as muitas vertentes da arquitectura a partir da “casa”, da porta à paisagem. O livro começa assim: “A casa é um lugar e um abrigo. Protege da chuva e do vento, do calor e do frio.”
Um projecto da Trienal de Arquitectura de Lisboa que “aponta para a variedade de escalas do habitar — o território, a cidade, a sala de jantar — e para como construímos a nossa casa comum com a intervenção no ambiente — a montanha — e criando artefactos — o chapéu —, e deixa adivinhar elementos da narrativa”, descrevem as autoras do texto.
Para ser realmente inclusivo, o álbum ilustrado sobrepôs, às ilustrações simples e de cores contrastadas, contornos, superfícies e texturas em alto-relevo para a leitura da imagem pelo tacto. O texto surge em tamanho grande, num tipo de letra desenhada para ser acessível, com transcrição em Braille.
Respondendo ao objectivo da inclusão, a ilustradora reviu algumas cores da paleta escolhida inicialmente, esteve mais atenta às dimensões e posições das personagens, simplificou e reviu elementos gráficos. “Fui mais precisa e segui mais orientações do que o habitual para as ilustrações mais técnicas”, revelou, admitindo que o processo de ilustração e concepção gráfica foi exigente e durou mais tempo do que é costume.
Este livro-objecto, muito bonito, especial e necessário, termina assim: “A casa é sonhada, imaginada, pensada. Depois é arquitectada e desenhada. É enfim construída, para ser vivida!” Tudo verdade.
Damos por nós a fechar os olhos e a acariciar cada página com a ponta dos dedos.
(Excerto/adaptação do texto divulgado no Público “Um livro para ler e ver (também) com os dedos”, a 11 de Janeiro de 2025.)
Obs.: Finalista dos Prémios Nova Bauhaus Europeia 2023. Para apoiar a impressão e para que o preço fosse mais acessível, a Trienal de Arquitectura de Lisboa lançou um convite de crowdfunding através da plataforma PPL. O livro também foi financiado pela Fundação Millenium, Fundação Calouste Gulbenkian e Imprensa Nacional Casa da Moeda.
Palavras-chave: casa, arquitectura, inclusão, cegueira, braille, lar.
Imagem-chave: página 25
Selo Distinção 2024
25 Mulheres
Escritora: Raquel Costa | Ilustradora: Raquel Costa
Editora: Oficina do Livro | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 44
Resenhista: Sara Reis da Silva
No feminino e pelo feminino. Assim é este volume no qual se dá a conhecer uma galeria de 25 mulheres, em cujas vidas se reflete a sociedade portuguesa dos inícios dos anos 70. São micronarrativas compostas num registo muito singelo, acompanhadas por composições ilustrativas que reproduzem figuras, cenários e situações variadas, em muitos casos, desvendando a verdadeira vida das protagonistas femininas. Na verdade, entre o texto verbal e o texto visual celebra-se, não raras vezes, um especial e revelador contraponto, estimulando o leitor a uma reflexão profunda sobre a condição feminina, a família, as condições laborais, a emigração, a liberdade e a opressão, as questões de género, a violência doméstica, as aparências e a essência, entre outros. É possível identificar ecos intertextuais e alguns referentes histórico-culturais, como as Três Marias e, até, Natália Correia. Alguns segmentos de texto intraicónico – na representação ilustrativa de cartazes – testemunham, ainda, a contestação social e, consequentemente, a sua repressão. Nos 50 anos do 25 de Abril (e sempre, aliás), este é um livro que, pela memória e pela relevância de que se reveste o seu acordar, no presente, merece ser lido e relido, partilhado entre pequenos e grandes leitores.
Palavras-chave: condição feminina, salazarismo, Estado Novo, liberdade, opressão, emigração.
Imagem-chave: páginas 40 e 41

Eu Sou Um Cão
Escritora: Heena Baek | Ilustradora: Heena Baek | Tradutora: Na Young Jung
Editora: Orfeu Negro | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 52
Resenhista: Dora Batalim
Heena Baek propõe uma narrativa contada na primeira pessoa por Pintas, um cão urbano que relata o seu quotidiano desde o nascimento. O foco narrativo é determinante para a experiência de leitura: ao adotar o ponto de vista do animal, o livro convida-nos a ver o mundo a partir da sua perspetiva, num exercício de alteridade construído de forma implícita, através da linguagem visual e verbal, sem recorrer à explicação direta ou ao discurso moralizante. A escolha do narrador e o tom ligeiro da narrativa permitem ao leitor reconhecer situações do dia a dia, mas a partir de um olhar deslocado, gerando empatia e também algum distanciamento crítico.
O tema da família está no centro da narrativa. Pintas observa e interpreta os gestos, hábitos e rotinas dos humanos que o acolhem, num processo de adaptação mútua, no qual ele também interfere e participa. A relação entre o cão e os humanos é narrada com humor e sensibilidade, através de episódios que misturam verosimilhança e absurdo. Essa ambivalência reforça a riqueza interpretativa do livro, que pode ser lido em diferentes níveis, por leitores de várias idades.
Visualmente, a obra distingue-se pela técnica: Heena Baek constrói os personagens e cenários em modelos tridimensionais, feitos à mão, que depois são fotografados sobre fundo branco. Este processo resulta numa imagem singular, que mistura manualidade e mise-en-scène com grande precisão. As composições revelam um domínio notável do ritmo narrativo: a organização das páginas, o posicionamento das personagens, os enquadramentos e mudanças de perspetiva criam um fluxo visual contínuo que orienta a leitura com eficácia. A dimensão cinematográfica dessas imagens é evidente — há cortes, aproximações, planos gerais e detalhes que servem a progressão da narrativa.
O texto verbal surge em articulação direta com a imagem, ampliando ou contrastando com ela, repleto de conotações e jogos semânticos, enriquecendo a narrativa ao propor leituras múltiplas e nem sempre imediatas. Há surpresas formais e narrativas ao longo do livro, que mantêm a atenção do leitor e criam pequenas quebras ou viragens que alimentam o ritmo da leitura.
“Eu sou um cão” constrói a sua força a partir da acumulação de pequenas observações e situações quotidianas, que vão revelando temas como a pertença, a identidade e a convivência com o outro. A ternura com que são tratadas as relações não impede a ironia ou o humor — pelo contrário, o equilíbrio entre esses elementos é central para a força expressiva do livro.
Trata-se de uma obra que desafia as convenções do livro ilustrado tradicional, tanto no plano visual como narrativo. A opção por uma técnica artesanal aplicada a uma estrutura visual contemporânea, aliada a uma narrativa construída com subtileza e sentido de observação, fazem deste livro um objeto singular no panorama atual da literatura infantil, merecedor de todos os destaques.
Obs.: O livro foi selecionado para o catálogo The White Ravens 2019. A autora ganhou o prémio ALMA em 2020.
Palavras-chave: cão, família, humor, cidade, amor.
Imagem-chave: páginas 8 e 9

Pequena Flor
Escritor: Anthony Browne | Ilustrador: Anthony Browne | Tradutora: Carla Maia de Almeida
Editora: Kalandraka | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 36
Resenhista: Sara Reis da Silva
A edição em Portugal de um livro-álbum assinado por Anthony Browne, artista reconhecido, em 2000, com o Prémio Hans Christian Andersen, é sempre motivo de regozijo.
A sua arte, o seu talento e a sua fina sensibilidade podem, agora, ser, de novo, apreciadas em Pequena Flor, obra ímpar originalmente publicada em 2008. Este volume guarda uma narrativa inspirada numa história verídica de um gorila do Zoo da Califórnia que aprendeu a comunicar a partir de gestos. Neste livro de Browne, a acção desenvolve-se em torno de um gorila solitário, capaz de se fazer entender através da linguagem gestual, a tal ponto que expressa o desejo de ter um amigo. Em resposta, os seus cuidadores apresentam-lhe uma pequena gata, chamada Pequena Flor, e uma amizade improvável e terna floresce entre os dois – e não é por acaso que as pequenas flores, ou melhor, rosas branca e rosa, que abrem e fecham o relato, têm, nos seus botões, a gatinha e o gorila, respectivamente. O desfecho surpreendente pauta-se pelo humor e pelo convite subtil à reflexão. Numa narrativa simples, verbalmente contida, mas visualmente profusa, são ficcionalizados tópicos profundos como a solidão ou a capacidade de empatia entre espécies diferentes. Através da relação entre os co-protagonistas, Browne contraria as percepções tradicionais sobre comunicação e compreensão, parecendo sugerir que a amizade e a compaixão transcendem barreiras linguísticas e físicas.
Num registo visual “com assinatura”, recorre a uma associação de estilos, conjugando a linguagem habitual nos seus livros – preenchida, multicolorida, com recurso a padrões, etc. – com uma outra coincidente com leveza e com a opção pelo traço/sombreado a preto e a branco. As ilustrações detalhadas do gorila contrastam ora com os fundos “limpos” ora com os fundos preenchidos de padrões, sugerindo talvez uma justaposição entre o primitivo e o sofisticado, mas parecendo reforçar a humanidade do protagonista, desafiando o leitor a reconsiderar as distinções entre humanos e outros animais.
Interessantes são, ainda, os jogos interartísticos também presentes neste livro-álbum, consubstanciando, aliás, uma linha criativa assídua e singularizadora da arte de Browne. De registar, a este propósito, as ressonâncias artísticas da arte de William Morris (1834–1896), nos padrões naturalistas dos papéis de parede ou no tecido da poltrona do protagonista, a inclusão da pintura Paisagem com a Queda de Ícaro (c. 1558), uma pintura a óleo de Pieter Bruegel (c. 1525-1530–1569) ou, ainda, o registo visual do célebre filme King Kong (1933).
Em suma, Pequena Flor é uma obra notável na qual é proporcionada ao leitor a possibilidade de reflectir sobre as complexidades das relações entre espécies e a natureza da compreensão mútua. Numa só palavra: inolvidável.
Palavras-chave: comunicação, língua gestual, compreensão, amizade, diferença, solidão.
Imagem-chave: páginas 24 e 25

Um e Sete
Escritor: Gianni Rodari | Ilustradora: Beatrice Alemagna | Tradutora: Elisabete Ramos
Editora: Kalandraka | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 28
Resenhista: Bru Junça
Tradução cuidada de um texto clássico de Gianni Rodari, publicado pela primeira vez em 1962, na colectânea “Contos ao telefone”, que imaginava um pai viajante, que todos os dias contava uma história à filha ao telefone, antes de dormir. Um e sete, sete e um, rapazes e seus pais, de diferentes pontos do mundo e diferentes profissões paternas, diversos na cor e nos cabelos, mas partilhando um sentido comum, o da infância. As ilustrações, usando sempre página dupla, servem magnificamente o texto, as figuras humanas imaginadas e as paisagens evocadas: Roma, Paris, Berlim, Moscovo, Nova Iorque, Xangai, Buenos Aires. A textura das imagens lembra recursos de desenho de uso comum pelas crianças: lápis de cor, lápis de cera, colagens. A atualidade e a pertinência do livro sublinham a qualidade que há mais de 60 anos se reconhece à história.
Palavras-chave: humanidade, diversidade, paz, criança, mundo, pai.
Imagem-chave: páginas 22 e 23

Minha Guia, Meu Capitão
Escritor: Gonzalo Moure | Ilustradora: Maria Girón | Tradutora: Elisabete Ramos
Editora: Kalandraka | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 36
Resenhista: Rita Pimenta
Um relato enternecedor sobre o que vê quem não vê. A caminho da escola, pai e filha, juntos nas suas dificuldades (um é cego e a outra mal vê), fazem jogos de imaginação com carros-animais: um Panda, um Carocha, um Jaguar ou um Seat León.
Passe-se a publicidade às marcas de automóveis e imagine-se cada um deles a deslocar-se na estrada com o animal que lhe corresponde em cima do tejadilho. É o que nos mostra a ilustradora em imagens com dinamismo e humor, espelhando os pensamentos das personagens.
Numa atmosfera colorida, mas não berrante, em que se recorre a lápis de cor, guache e gravura, vamos sendo surpreendidos com a floresta urbana e a genuína que ambos constroem e exploram. Perguntamo-nos: quem guia quem nesta selva de luzes, sombras e sons?
Diz a filha que o pai vê muito mais do que ela e do que qualquer outra pessoa no mundo. Sabe que aquele homem que passou por eles “está triste”, que o “mar está bonito” e que é preciso cuidado com um candeeiro no caminho.
Um livro que nem chega a ter propriamente uma história, é uma descrição de um percurso diário que duas pessoas com deficiência visual transformam num passeio mágico e feliz.
Eis o momento, bonito, da narrativa que sustenta o título: “Chama-me ‘Minha Guia’, mas a verdade é que, embora eu veja um pouco e ele não veja nada, é ele quem me guia, ‘Meu Capitão’.” Antes, a menina já nos tinha feito saber: “A minha mão é pequena na mão do pai.”
De mãos dadas, é sempre mais fácil. Mesmo quando se vê.
Obs.: Prémio Fundação Cuatrogatos em 2021.
Palavras-chave: : família, cegueira, imaginação, dedicação, cidade, parentalidade, animais.
Imagem-chave: páginas 4 e 5

O Que nos Torna Humanos
Escritor: Victor D. O. Santos | Ilustradora: Anna Forlati
Editora: Fábula e UNESCO | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 44
Resenhista: Iêda Alcântara
Já te perguntaste o que nos torna humanos? O pensamento simbólico, a nossa capacidade de contar e ouvir histórias, o fato de cozinharmos… Há tantas respostas possíveis que dificilmente encontrarás uma única que satisfaça por completo essa indagação. Mas há algo que, segundo o autor, está na base da nossa humanidade e da natureza humana. É nesse enigma que este livro nos convida a mergulhar. Ao virar de cada página, somos guiados com pistas cuidadosamente construídas: algo que existe há muito tempo, cujas raízes remontam a séculos; que está em toda a parte; que no início era apenas uma; que, em alguns lugares, está a desaparecer rapidamente; que uns utilizam apenas uma, outros duas, e outros ainda mais; que é, sem dúvida, a maior invenção de todas…
As ilustrações, com texturas ricas, contrastes expressivos e uma paleta de cores terrosas, não só acompanham a narrativa como também a expandem, criando um espaço para a imaginação e para a contemplação de cada detalhe e nuance. E assim, somos levados a destrinchar aquilo que nos define e nos conecta enquanto seres humanos.
Lançado em parceria com a UNESCO, reconhecido internacionalmente e traduzido para mais de 20 línguas, este livro será disponibilizado em acesso livre em formato digital um ano após a sua publicação. Um verdadeiro convite para refletirmos sobre a nossa diversidade e sobre o que nos une. No final da leitura, encontrarás a resposta — e perceberás o quanto ela é essencial para entendermos quem fomos, quem somos e quem queremos ser.
Palavras-chave: humanidade, diversidade, conexão, identidade, empatia.
Imagem-chave: páginas 28 e 29

A Bibliotecária de Auschwitz: Novela Gráfica
Escritor: Salva Rubio | Ilustradora: Loreto Aroca | Tradutora: Salomé Castro
Editora: Fábula | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 140
Resenhista: Maria José Vitorino
Novela gráfica baseada no romance premiado de Antonio Iturbe, A bibliotecária de Auschwitz, de 2012. Os autores criam uma obra de grande qualidade, transportando a história real em que Iturbe se inspirou para um formato arrojado e surpreendente.
Em plena Segunda Guerra Mundial, Dita Adlerova é uma adolescente checa levada, com a família e tantos outros judeus, para um dos campos de concentração mais mortíferos: Auschwitz. Com alguns livros, torna-se “a bibliotecária” do campo, onde os livros estão proibidos, sob pena de morte. Uma comovente e inspiradora história prende o leitor do princípio ao fim, narrando dias e noites de horror, em que a jovem mantém a esperança, ancorada na amizade e no amor aos livros.
Na verdade, um professor judeu, Fredy Hirsh, criou uma escola secreta dentro do bloco 31, no campo de concentração de Auschwitz, dedicando-se a lecionar a cerca de 5 crianças. Criou também uma biblioteca de poucos volumes com a ajuda de Dita, uma menina judia de 14 anos, que se arriscava para manter viva a esperança trazida pelo conhecimento e escondia os livros por baixo do vestido. É um registo de uma época tremenda da História, mas que também mostra a coragem de pessoas que não se renderam ao terror e se mantiveram firmes usando os livros como ‘arma’. É de referir o Epílogo, que explicita a relação entre o romance e a verdade histórica do séc. XX: na última página, desvenda-se o processo de criação da novela gráfica.
Palavras-chave: nazismo, livros, segunda guerra mundial, esperança, resistência.
Imagem-chave: página 56 e 57

O Rapaz dos Jornais
Escritor: Vince Vawter | Ilustrador da capa: Chris Sheban | Tradutora: Maria Leitão
Editora: Fábula | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 224
Resenhista: Rita Pimenta
Um rapaz de 11 anos, na América de 1959, em Memphis, debate-se com a sua gaguez. Essa limitação vai pô-lo ainda mais à prova quando se oferece para substituir o seu amigo Art na distribuição de jornais durante o mês de Julho. O protagonista trata-o por Rat porque, no primeiro dia de aulas do terceiro ano, não conseguiu dizer o “A”. Apesar de, em inglês, “Rat” significar “ratazana”, não se importou. “Ele deixou que eu o tratasse assim e isso fez com que eu passasse a gostar dele”, descreve-se nas páginas iniciais.
Nas suas rondas de entrega de jornais e recolha dos pagamentos, o “rapaz dos jornais” descobre uma realidade de violência doméstica e racismo no seu bairro. Fora dele também.
Trava conhecimento com um homem culto, com muitos livros, ex-marinheiro mercante, o Sr. Spiro, que lhe diz: “Em todos os portos há bons livros à venda por ninharias. Alguns marinheiros mercantes entalham os cabos das vassouras para passar o tempo no mar. Eu preferi passar os trinta anos que estive em alto-mar a ler e a estudar.”
O convívio breve do rapaz com este leitor (também) de jornais e a forte ligação à Mam, que cuida dele (chama-lhe Homenzinho), da sua casa e espera pelas suas palavras trôpegas, dão-lhe a confiança necessária para enfrentar o mundo. Até para aceitar que o seu pai é adoptivo. Ficou a admirá-lo ainda mais.
Muito cresceu este miúdo naquele Verão. E não estamos a falar de tamanho ou altura.
Um livro sensível, bem escrito, com uma tradução competente e que possibilita aos pré-adolescentes de hoje o conhecimento de um passado sem ecrãs. Quem disse que não existem máquinas do tempo?
Palavras-chave: deficiência, racismo, violência, jornais, crescimento, América.

Quando as Coisas Desacontecem
Escritora: Alessandra Roscoe | Ilustrador: Odilon Moraes
Editora: Alfarroba | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 60
Resenhista: Iêda Alcântara
Se as coisas acontecem, deveriam também desacontecer, não te parece óbvio? Mas este verbo não existe no nosso dicionário – foi Gabriela, uma menina curiosa e atenta aos movimentos da vida, quem o inventou. E, ao inventá-lo, abriu espaço para grandes perguntas: o que acontece às coisas quando desacontecem? A onda desacontece em espuma, a semente em fruto, a nuvem em chuva, o medo em esperança, o silêncio em canção… Mas e as pessoas? O que acontece quando as pessoas desacontecem? Essa é uma resposta mais difícil, que vale a leitura para refletirmos juntos.
O texto, com uma linguagem repleta de metáforas, apresenta Gabriela como uma personagem que questiona o óbvio e o invisível. Ao acompanhar os seus pensamentos descobrimos uma nova perspectiva sobre as transformações e ciclos da vida – um olhar que não se prende à perda, mas que enxerga a potência das mudanças.
As ilustrações em aguarela, com um traço leve e fluido, dialogam perfeitamente com o tom contemplativo do texto e conseguem capturar a poesia dos movimentos da natureza e do pensamento da Gabriela. A paleta de cores suaves reforça o tom introspectivo e permite que as páginas transmitam serenidade, mesmo quando abordam questões desafiadoras como o “desacontecer” humano.
Palavras-chave: transformação, impermanência, renovação, mudança, metamorfose.
Imagem-chave: páginas 56 e 57

Meio Miguel
Escritor: Pepe Maestro | Ilustrador: Raúl Guridi | Tradutor, Música e Voz: Luís Correia Carmelo | Construção do Livro-Objecto: Pedro Maia e Mafalda Milhões
Editora: Silêncio e O Bichinho de Conto | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 24
Resenhista: Margarida Costa
A experiência imersiva deste livro-objeto começa com o rasgar do picotado da capa (um passo irrepetível) e que faz a transição da capa com uma nuvem chuvosa para o início da narrativa. Um raio cai sobre Miguel, partindo o protagonista em duas metades. Para ir além da experiência visual do livro silencioso, o leitor tem acesso à história de Miguel através de um código QR. Alarga-se então a experiência, através da versão musicada, com a concertina e a voz do narrador oral. O ritmo da narração intercala melodia e silêncio na justa medida, ligando-se naturalmente com as ilustrações em tom sépia, num tom poético e gracioso. Duas formas de percecionar a história de um personagem que segue duas formas independentes de viver a sua vida, uma mais segura e tradicional, a outra mais ousada e aventureira, o que convida o leitor mais experiente a pensar sobre as opções na vida. Já aos mais novos, mesmo pré-leitores, acompanhar a leitura das imagens com a narração áudio permite momentos de leitura autónoma a solo ou entre pares. Esta história interativa, que pretende consagrar a palavra, a língua e a arte de contar histórias, faz parte de um projeto maior, cujos detalhes e propósitos podem ser conhecidos aqui.
Palavras-chave: identidade, autoconhecimento, independência, relações, vida.
Imagem-chave: páginas 8 e 9
Selo Seleção 2024
A Colher
Escritora: Sandra Siemens | Ilustradora: Bea Lozano | Tradutora: Susana Cardoso Ferreira
Editora: : Fábula | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 36
Resenhista: Bru Junça
Excelente ilustração, com boa paleta de cores e delicadeza, muito alinhada com a essencialidade do texto. Abordagem pouco frequente da memória e dos objectos do quotidiano. A colher foi bem escolhida, assinala o carácter inclusivo do livro – todas as culturas e segmentos sociais e etários usam a colher diariamente. Valoriza a imaginação das crianças no seu tempo de brincar e conviver com a família. A história flui, com movimento, num texto contido, claro e significativo. Tradução cuidada, optando por um título em português, A Colher, que desafia a comparação com o original, “Esa Cuchara”, obra publicada pela primeira vez em 2020 (Argentina), que foi incluída na Lista de Honra IBBY e na selecção anual da Biblioteca Internacional da Juventude de Munique (White Ravens), recebeu o Prémio Fundación Cuatrogatos em 2021.
Palavras-chave: memória, brincar, família, objecto do quotidiano, história familiar.
Imagem-chave: página 3

A Gigantesca Pequena Coisa
Escritora: Beatrice Alemagna | Ilustradora: Beatrice Alemagna | Tradutora: Maria José Sarabando
Editora: : Orfeu Negro | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 36
Resenhista: Rui Marques Veloso
Nada mais difícil do que definir algo que é abstracto, o que se constata imediatamente na antítese do título. A narradora foca uma série de situações que poderão identificar essa entidade fugidia, que muitos não reconhecem e outros procuram conquistar. A gestão da expectativa é superior, obrigando o leitor a encontrar a resposta somente na última palavra da última página. A ilustração é extraordinária, fundindo-se completamente com o texto, o que gera uma unidade absoluta.
Palavras-chave: felicidade, sociedade, infância, intimidade, autoconhecimento.
Imagem-chave: página 13

A Jennifer Chan Não Está Sozinha
Escritora: Tae Keller | Ilustração da capa: San Min Book Co. | Tradutora: Dulce Afonso
Editora: Fábula | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 304
Resenhista: Dora Batalim
Neste romance juvenil, Tae Keller explora as dinâmicas de grupo, o bullying e o confronto com a diferença através da história de Jennifer Chan, uma nova aluna que não se encaixa nos padrões da escola. Excêntrica e convicta das suas crenças, Jennifer desafia as convenções sociais dos colegas, o que leva a uma cadeia de exclusões mais ou menos subtis — até ao seu misterioso desaparecimento.
A narrativa é contada por Mallory, colega de turma, que oscila entre o desejo de pertença e a consciência das suas próprias ações. O uso da primeira pessoa aproxima o leitor e revela gradualmente os conflitos internos da protagonista, levando-nos a questionar as fronteiras entre ação, omissão e responsabilidade.
Tae Keller parece evitar estereótipos e moralismos fáceis, oferecendo personagens complexas e um retrato da adolescência que procura ser honesto. A escrita é direta, com diálogos naturais e bom ritmo narrativo. O livro trata temas como amizade, arrependimento e mudança pessoal, mostrando como mesmo os gestos mais pequenos têm impacto — e como todos temos a capacidade de nos transformarmos e de fazer a diferença na vida dos outros.
Uma leitura atual e pertinente, que convida à empatia e à reflexão sobre o lugar de cada um num grupo.
Obs.: Coleção Estrelas da Literatura Juvenil. Escritora vencedora do prémio Newbery Medal, em 2021, com o livro When you trap a tiger.
Palavras-chave: identidade, crescimento, bullying, amizade, adolescência.
Imagem-chave: página 291

Agora e para Sempre
Escritora: Chiara Lorenzoni | Ilustrador: Marco Somà | Tradutor: Diogo Madre Deus
Editora: Nuvem de Letras | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 28
Resenhista: Paula Cusati
Uma família de raposas (outrora três, agora só a Olívia e o pai) tenta viver a sua vida o melhor que consegue, esforçando-se por manter o equilíbrio através de rotinas antigas. Porém, embora haja agora muitos mais abraços sem aviso, a vida no “antes” tinha mais cheiro, mais música, mais histórias e mais sabor. Com a ajuda do pai, a Olívia aprende a lidar com a tristeza que lhe enovela as palavras no peito e com a raiva. Juntos, constroem algo novo, num tempo outro, de que a mãe fará sempre parte.
Uma narrativa terna, que trata com delicadeza a morte de uma mãe e o luto. O texto com que Chiara Lorenzoni se estreia em Portugal constrói esses tempos antagónicos com imagens potentes (a omeleta queimada, as palavras emaranhadas, a pilha de madeira que se transforma) e é engrandecido pelas cuidadas ilustrações, plenas de detalhes, de Marco Somà, com as suas habituais figuras antropomorfizadas dos animais protagonistas, em tons pastel inicialmente escuros que se vão suavizando à medida que se aproximam do final da história. A grande nuvem escura da guarda inicial também se irá desvanecer e dar lugar a um céu limpo e estrelado na guarda final. De forma sensível e engenhosa, o ilustrador encontra forma de juntar a família, mesmo no início que parecia tão escuro: basta atentar no reflexo na água ou na sombra por trás de uma cortina.
Um livro que convida a ler em família e a conversar.
Palavras-chave: família, morte, luto, palavras, afecto.
Imagem-chave: páginas 4 e 5

As Galochas Vermelhas
Escritor: Pedro Seromenho | Ilustradora: Rachel Caiano | Design: Juliana Vidigal
Editora: Paleta de Letras | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 34
Resenhista: Rita Pimenta
A história de uma menina que tem umas galochas vermelhas que vão passando de geração em geração acabou por se transformar numa homenagem aos 50 anos do 25 de Abril de 1974. As galochas podem ser entendidas como símbolo de liberdade, que não deve ser dada como garantida.
Com este livro, o autor do texto também teve o propósito de “brincar com as cores, principalmente com o vermelho”. Explicação: “Por vezes, os mais pequeninos têm aversão ao vermelho, porque conotam com o sangue. Então, brinquei com a cor das melancias, das romãs, da lava, do ocaso no horizonte e, claro está, do amor e dos cravos vermelhos que as pessoas crescidas colocam na lapela dos casacos quando gritam: liberdade!”
O talento da ilustradora, com as suas figuras de faces rosadas, emprestou ao texto uma expressão plástica e dinâmica que conquistam de imediato o leitor. Saiba ou não que é a liberdade que aqui se representa e que sobre ela se reflecte.
Um livro-álbum de grande formato, muito bonito e resistente. Como gostaríamos que a liberdade fosse.
(Excerto/adaptação do texto divulgado no Público “Não dar a liberdade por garantida”, a 13 de Março de 2024.)
Palavras-chave: infância, família, liberdade, história, 25 de Abril de 1974.
Imagem-chave: páginas 32 e 33

As Histórias que a Avó Esqueceu (e Como Eu as Descobri)
Escritora: Nadine Aisha Jassat | Ilustradora: Sandhya Prabhat | Tradutora: Helena Cruz Ventura
Editora: Book Smile | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 352
Resenhista: Maria José Vitorino
Nyla tem 12 anos e irá tentar desvendar a verdade sobre a morte do pai, ao mesmo tempo que procura entender o que se está a passar com a avó.
Uma novela sobre identidade, memória e laços familiares, em que o texto aparece em linhas como se fossem versos, com forte carga poética, acompanhado por ilustrações singelas. Marcado pela autenticidade, contém muito mais mistério do que o título e a ilustração da capa deixam adivinhar. Sem dúvida de leitura interessante para adolescentes, pelo formato escolhido e pelos temas que aborda: descoberta de si mesmo, racismo, bullying, amizade e família, incluindo dimensões associadas a outras gerações, como os efeitos da doença de Ahlzeimer.
Obs.: Nadine Aissa Jassat é uma das vencedoras do Scottish Book Trust New Writers Award e foi nomeada para diversos prémios: Inspiring Women Under 30 In Scotland, Outspoken London Prize for Poetry in Film, The Edwin Morgan Poetry Award, Herald Scottish Award, UKLA Book Award.
Palavras-chave: autenticidade, avó, família, segredo, memória.
Imagem-chave: páginas 256 e 257

Bashshar, o Guardador de Pássaros
Escritora: Lurdes Breda | Ilustrador: Roberto Chichorro | Revisão científica para a língua bantu: Gervásio Absolone Chambo
Editora: Escola Portuguesa de Moçambique — Centro de Ensino e Língua Portuguesa | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 48
Resenhista: Rita Pimenta
Durante muitas gerações, os pássaros respondiam ao som do batuque da família de Bashshar e aproximavam-se da aldeia. Mas há muitos anos que a mistura de aves e flores desapareceu da paisagem de Waissy, onde o guardador de pássaros era celebrado pelo povo como o mensageiro das boas novas. Alguém amaldiçoou o chão da aldeia, nada floresce e os pássaros nunca mais regressaram. Será que voltarão?
O nome do protagonista, Bashshar, é de origem árabe, usa-se em Moçambique e significa “mensageiro de boas novas”.
Uma prosa poética de uma autora que assinala, com este título luso-moçambicano, 20 de anos de edições. No final, um breve glossário ajuda à compreensão de várias palavras, quer em português quer em bantu. Xitukulumukhumba é “um monstro mítico e mau que vive na floresta, papão, em Ronga e Xichangana”.
O pintor Roberto Chichorro, que ilustra esta narrativa, nasceu em 1941, em Lourenço Marques (actual Maputo), e acredita “no hábito do sonho”. Diz que este não foi mais do “que criar imagens que fizessem e justificassem o que a Lurdes Breda tão bem foi capaz de dizer. Do encanto dos sonhos que fizeram acreditar num mundo de ser bom”. Pelo sonho é que vamos.
(Excerto/adaptação do texto divulgado no Público “Será que os pássaros voltarão a Waissy?, a 14 de Setembro de 2024.)
Palavras-chave: tradição, Moçambique, natureza, indígena, sonho.
Imagem-chave: páginas 16 e 17

Capuchinho Vermelho
Escritora: Concha Pasamar | Ilustradora: Concha Pasamar | Tradutora: Andreia Salgueiro
Editora: Alfarroba | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 32
Resenhista: Bru Junça
Concha Pasamar traduz e reescreve a versão publicada em 1697 do conto tradicional de Charles Perrault, que teria inúmeras versões, até hoje, sem perder o fascínio. Trata-se de um clássico, como se comprova pela atualidade da sua mensagem e dos símbolos a que recorre. As ilustrações, da mesma autora, a lápis negro e vermelho, jogam bem com a tradição e perturbam no presente. Uma ilustração que inquieta pela subtileza e pela força dos elementos representativos do simbólico.
A moral, que Perrault não dispensava quando adaptava os temas da tradição oral, é aqui mantida, embora de uma forma literária mais branda.
Há algumas opções muito interessantes ao nível do design, como, por exemplo: o facto de a capa não ter o título por escrito. No entanto, todos leem Capuchinho Vermelho ao olhar para a(s) capa(s). Seguindo esta linha de raciocínio, talvez fosse melhor se a contracapa dispensasse a sinopse, pois mantinha assim a intriga e o mistério da versão de uma história sobejamente conhecida, mas a qual o livro nos instiga a querer (re)ler, desde o primeiro momento.
Palavras-chave: Capuchinho Vermelho, conto tradicional, Perrault, moral, lobo.
Imagem-chave: páginas 4 e 5

Cartas Felizes
Escritora: Susanna Isern | Ilustrador: Daniel Montero Galán | Tradutores: Rita Custódio e Àlex Tarradelas
Editora: Nuvem de Letras | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 32
Resenhista: Rita Pimenta
Um convite à sã convivência e à resolução pacífica de conflitos em comunidade, mas também um alerta para que estejamos atentos a quem perto de nós vive em solidão. É através de um velho carteiro que distribui cartas misteriosas que estes objectivos se cumprem. Numa atmosfera plástica quente, envolvente e misteriosa.
Quando se aproxima da casa de cada animal para entregar a correspondência, o carteiro diz, num sussurro: “Carta vai.” Entrega ao esquilo e ao ouriço as cartas de um para o outro, o mesmo entre o arganaz e o pica-pau, a tartaruga e as borboletas, o coelho e o urso e a outros animais da floresta. Suaviza desavenças entre todos.
O que eles não sabem é que o autor das cartas é sempre o mesmo.
Um dia, o próprio carteiro recebe uma carta. “Carteiro, carta vai”, diz, feliz, quando põe a carta na caixa de correio de sua casa. Abre-a logo em seguida, entra em casa e começa a lê-la. Quem a terá escrito? O que dirá?
Obs.: Livro vencedor do Moonbeam Children’s Book Award e do International Latin Book Award 2017.
Palavras-chave: comunidade, amizade, animais, floresta, solidariedade, solidão.
Imagem-chave: páginas 4 e 5

Casa de Família
Escritora: Sophie Blackall | Ilustradora: Sophie Blackall | Tradutora: Susana Cardoso Ferreira
Editora: Fábula | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 44
Resenhista: Margarida Costa
Tendo comprado uma antiga quinta de laticínios, a autora deparou-se com uma casa praticamente em ruínas, na qual doze crianças tinham nascido e crescido há um século; a velha senhora que lha vendeu foi uma delas. Este livro belíssimo funde um exercício autobiográfico com a história de uma família, em parte imaginada, em parte fruto da sua observação e pesquisa. Antes da demolição, recolheu deslumbrantes vestígios familiares de uma vida passada: fotografias e papel de parede impresso à mão, um lenço e um vestido de noiva, velhas chaves de latão e livros empoeirados, uma caixa de trapos encharcados de lama que se revelaram vinte e um vestidos coloridos costurados à mão, como refere na nota em jeito de posfácio. Ao longo de alguns anos, construiu esta história, sobrepondo meticulosamente, camada atrás de camada, os materiais recuperados na casa com tinta da China, aguarela, guache e lápis de cor.
A uma ilustração extraordinariamente complexa, que faz emergir memórias e afetos, acresce uma prosa poética que é uma única frase. Uma frase que serpenteia entre “es” e “ous”, tal como todas as vidas. Uma frase que atravessa um século desde a fundação da quinta pela família que nos é apresentada com o passar do tempo, página a página, até à conceção pela autora deste livro encantador, homenagem à família Swantak e a todas as “histórias [que] continuarão a viver enquanto forem contadas”.
Palavras-chave: família, memória, escrita, ruralidade, afeto.
Imagem-chave: páginas 6 e 7

Deuses e Heróis da Mitologia Grega
Escritora: Ana Maria Shua | Ilustrador: João Moreno | Tradutor: Artur Guerra
Editora: Fábula | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 232
Resenhista: Rui Marques Veloso
Trabalho de divulgação do essencial da mitologia grega com um discurso dirigido especialmente aos jovens no sentido de interiorizarem esta vertente da cultura ocidental. Com uma abordagem muito acessível, encontramo-nos com figuras e acontecimentos que povoam o nosso imaginário – a Guerra de Tróia, o julgamento de Páris, a caixa de Pandora, o Velo de ouro ou o Minotauro, entre outros bem conhecidos. Altamente recomendável para a cultura dos nossos jovens.
Palavras-chave: mitologia, deuses, heróis, Guerra de Tróia, Universo.
Imagem-chave: página 187

Esta Árvore é Minha (Não te Aproximes)
Escritor: Olivier Tallec | Ilustrador: Olivier Tallec | Tradutora: Francisca Cortesão
Editora: Nuvem de Letras | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 36
Resenhista: Maria José Vitorino
Um livro divertido, com belas ilustrações, que conta uma história com várias camadas de leitura, sempre pertinentes e atractivas.
Com uma paleta de cores sensível e atraente, apresenta bom equilíbrio entre texto e imagem. O autor é um conhecido ilustrador francês, com dezenas de títulos publicados, e transporta para a literatura estratégias da publicidade, de que se destaca o humor e a surpresa.
O nosso presente reconhece na história deste esquilo que se isola com muros muitos episódios do mundo actual. Para as crianças, é uma obra sugestiva porque não explica, mostra a partir da acção da própria personagem. Para todos, uma proposta interessante, com um ritmo muito bem encontrado.
Palavras-chave: tacanhez, muro, egoísmo, humor, floresta.
Imagem-chave: página 26

Eu Sou Um Tigre
Escritor: Karl Newson | Ilustrador: Ross Collins | Tradutora: Helena Cruz Ventura
Editora: The Poets and Dragons Society | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 28
Resenhista: Margarida Costa
Um destemido ratinho declara “Eu sou um tigre” e consegue convencer um guaxinim, uma raposa, uma cobra e um pássaro não só de que isso é verdade, mas de que eles não são o que pensam que são. Quando um tigre de verdade aparece, o clímax narrativo é atingido, mas o leitor é surpreendido de novo. Não é que o persuasivo e ousado rato consegue persuadir o tigre de que ele é o rato?
Com um texto simples e hilariante e ilustrações brilhantes e vivas, este divertido livro é delicioso para ser lido em voz alta, provocando uma perplexidade divertida do público infantil, com um final surpreendente que abre para uma nova narrativa na imaginação do leitor.
Obs.: Ganhador dos prémios: Georgia Children’s Book Award – WINNER 2022, South Dakota Children’s Book Award – WINNER 2022, Leicester ‘Our Best Picture Book’ Award – WINNER 2019, West Sussex Picture Book Award – WINNER 2019.
Palavras-chave: animais, humor, non-sense, auto-imagem, surpresa.
Imagem-chave: página 16

Julieta Pirueta
Escritor: Brian Freschi | Ilustradora: Elena Triolo | Tradutora: Inês Guerreiro
Editora: Nuvem de Letras | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 184
Resenhista: Iêda Alcântara
Julieta enfrenta muitas mudanças: nova casa, nova escola, novos amigos. No meio de tantas novidades, sente-se desconectada, especialmente porque muitos à sua volta parecem brilhar nos desportos — algo que, definitivamente, não é o seu forte. Mas a mãe insiste… porque será? Entre tropeções e tentativas frustradas de se encaixar, Julieta descobre algo que muda tudo: a dança. Dançar torna-se uma forma de se expressar e, finalmente, de se sentir confortável no seu próprio corpo e no mundo que a rodeia.
Uma novela gráfica com traço dinâmico e muito expressivo, aliado a uma paleta de cores suaves. As ilustrações conseguem transmitir tanto as trapalhadas como as emoções de Julieta, num equilíbrio perfeito entre a comédia dos “desastres desportivos” e a beleza da expressão artística.
A força desta história, repleta de humor e sensibilidade, está na forma como aborda os pequenos grandes desafios do quotidiano de uma menina: lidar com a insegurança, as comparações e a sensação de não pertencer. Para os adolescentes que enfrentam as mudanças da vida e a autodescoberta, esta é uma mensagem poderosa sobre a importância de aceitar quem somos e encontrarmos o nosso lugar no mundo. É uma celebração da coragem e dos desafios de Julieta para se tornar a Julieta Pirueta.
Palavras-chave: autodescoberta, dança, adaptação, expressão, resiliência.
Imagem-chave: páginas 136 e 137

Muito Serra a Serra da Estela
Escritor: António Mota | Ilustrador: Helder Teixeira Peleja
Editora: Asa | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 28
Resenhista: Bru Junça
Cinquenta trava-línguas inéditos, ilustrados com alegria, remetendo para a tradição oral, o léxico actual e a fala corrente. O humor patente desde o título – que faz tropeçar a leitura entre a palavra escrita (Estela) e a memória do nome da conhecida Serra portuguesa (Estrela) – atravessa todas as páginas. Um livro divertido e estimulante e uma abordagem pouco frequente da oralidade e da ambiguidade do vocabulário que usamos. Um bom livro para puxar pela língua e aprimorar a dicção, simplesmente brincando. Um excelente verbo para colocar ao serviço da Língua Portuguesa, aqui balançado com ritmo, musicalidade, tropeços linguísticos propositados que pressupõem o diálogo em pequeno ou em grande grupo. Momentos cruciais de relação, de escuta e, consequentemente, de afectividade. Talvez um outro formato valorizasse ainda mais este tipo de texto e ampliasse a proposta bem-humorada transmitida pela ilustração.
Palavras-chave: travalínguas, oralidade, vocabulário, jogo, humor, coleção.
Imagem-chave: páginas 10 e 11

O Jardim da Minha Avó
Escritor: Jordan Scott | Ilustrador: Sydney Smith | Tradutora: Susana Cardoso Ferreira
Editora: Fábula | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 44
Resenhista: Dora Batalim
Baseado nas memórias de infância do escritor, este livro retrata a relação entre um neto e a sua avó, com quem não partilha a mesma língua. É estruturado a partir de uma visita do narrador à casa da avó, e da exploração do seu jardim, um espaço central e simbólico. O jardim, ao mesmo tempo físico e afetivo, funciona como metáfora do tempo passado juntos, da transmissão intergeracional e da herança cultural que se transmite através do corpo, dos sentidos, da repetição de gestos e da observação silenciosa. A figura da avó é apresentada como enraizada naquele lugar, e é através da experiência sensorial do neto — os cheiros, as texturas, a terra, os objetos — que a sua presença se torna compreensível.
O texto funciona em articulação subtil com as ilustrações, que sustentam o desenvolvimento narrativo através de composições que alternam entre planos abertos – que contextualizam o espaço rural, o jardim, a casa – e planos de pormenor, que captam detalhes expressivos dos rostos, mãos e objetos. A disposição das imagens nas páginas e a composição gráfica revelam um controlo apurado do ritmo visual que acompanha e sustenta a fluidez do texto verbal, mesmo quando este se reduz a quase nada.
As imagens muito plásticas a guache e aguarela de Sydney Smith, criadas com grande domínio de luz, cor e ritmo, exploram a intimidade do espaço doméstico e a relação entre gerações, neto e avó.
A ausência de diálogo explícito – coerente com a proposição da falta de uma língua verbal comum – é preenchida pelas ilustrações que dão a ver a construção daqueles laços familiares, através da memória e da escuta. Por isso, O Jardim da Minha Avó é um livro que beneficia de mediação, precisamente por se apoiar em subtilezas narrativas, visuais e simbólicas; a sua força está menos na ação e mais na atmosfera. É um livro que convida à lentidão, à pausa e, por isso, sublinhamos a importância de um acompanhamento mediador que permita aos leitores mais jovens ou menos experientes explorar plenamente a poesia que nele se inscreve de forma implícita.
Obs.: A leitura da introdução, escrita pelo autor, é recomendada para aceder às camadas autobiográficas e temáticas da obra.
Palavras-chave: avó, neto, natureza, tempo, comunicação.
Imagem-chave: páginas 12 e 13

O Misterioso Gigante
Escritor: Lorenzo Coltellacci | Ilustrador: Lorenzo Sangió | Tradutora: Andreia Salgueiro
Editora: Alfarroba | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 32
Resenhista: Iêda Alcântara
Já alguma vez viste um gigante? Nem eu, mas imagino que seja mesmo muito grande e que faça coisas que nós, mais pequenos, não conseguimos fazer. É exatamente isso que este livro nos convida a imaginar. Naquela aldeia, ninguém sabe ao certo de onde vem “o gigante” ou mesmo quem ele é. Alguns acreditam na sua existência, outros duvidam. Quem acredita diz que o gigante adora brincar e banhar-se no lago, que às vezes fica aborrecido, que gosta da luz presa nos candeeiros e desaparece sempre ao amanhecer, deixando a aldeia em mistério. Onde viverá ele durante o dia? Algumas crianças juram já tê-lo ouvido chorar em noites de tempestade. Mas uma coisa é certa: ele nunca deixa vestígios.
Com o uso marcante do azul da noite e do amarelo do dia e das luzes da aldeia, as ilustrações enriquecem a experiência de leitura, e as imagens criam uma atmosfera mágica que exalta o tamanho do gigante em contraste com as casas pequeninas. Os traços da figura do gigante destacam a dualidade entre o que poderia parecer assustador para os outros e o que, na verdade, é para ele mesmo.
No final, a narrativa, que mistura mistério, curiosidade e uma dose de fantasia, conduz o leitor a uma bela surpresa: será que os gigantes, aqueles tão grandes e imponentes, podem ser algo muito diferente do que imaginamos? Talvez até… um gigante nem tão crescido assim?
Palavras-chave: mistério, fantasia, imaginação, perspectiva, gigante.
Imagem-chave: páginas 4 e 5

O Primeiro Natal do Pai Natal
Escritor: Mac Barnett | Ilustrador: Sydney Smith | Tradutora: Susana Cardoso Ferreira
Editora: Fábula | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 44
Resenhista: Paula Cusati
O escritor norte-americano Mac Barnett regressa à temática natalícia, após o divertidíssimo Como é que o Pai Natal entra pela chaminé?, ilustrado pelo amigo e habitual companheiro em muitos livros-álbum, Jon Klassen. Desta vez, porém, o recém-nomeado “National Ambassador for Young People’s Literature” (Embaixador Nacional da Literatura para Crianças e Jovens) faz parceria com Sydney Smith, prémio Hans Christian Andersen 2024 de Ilustração. E é uma parceria vencedora.
Quem nunca ouviu a pergunta: “Como será o Natal do Pai Natal?” Pois este livro apresenta-nos uma fresca e tocante resposta possível. Já há tantas histórias sobre o Pai Natal, mas Mac Barnett e Sydney Smith conseguem fazer-nos rir e sorrir enternecidos, lembrados do verdadeiro espírito natalício. O humor atravessa toda a história, com a árvore de Natal demasiado grande que se insiste em fazer entrar em casa, o urso polar disfarçado e o Pai Natal, qual criança, que não consegue esperar que a mesa esteja posta. A ilustração, com páginas dotadas de uma luz extraordinária, imprime um ritmo narrativo magistral, num diálogo perfeito entre texto e imagem.
Palavras-chave: Natal, Pai Natal, gratidão, amizade, consoada, tradição.
Imagem-chave: páginas 30 e 31

O Que Vês Quando Olhas Para Uma Árvore?
Escritora: Emma Carlisle | Ilustradora: Emma Carlisle | Tradutora: Susana Cardoso Ferreira
Editora: Fábula | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 44
Resenhista: Maria José Vitorino
Belamente ilustrado, o livro leva-nos a reparar nas árvores e a conectarmo-nos com a Natureza, hoje e no futuro. A componente informativa apresenta conceitos rigorosos com sensiblidade e em linguagem acessível, em coerência com as ilustrações e a sua carga poética, que lembra os diários gráficos dos cientistas e dos “urban sketchers” (desenhadores urbanos), e introduzindo palavras menos frequentes, como, por exemplo, serotonina, micorrizas. Um livro útil para mediação que valorize o conhecimento científico, o pensamento crítico e a descoberta atenta dos outros seres vivos que partilham connosco o planeta. A mensagem final da autora é de leitura recomendada pelos mediadores.
Palavras-chave: árvores, natureza, estações do ano, tempo, contemplação.
Imagem-chave: páginas 10 e 11

Os Swifts: Uma Galeria de Patifes
Escritora: Beth Lincoln | Ilustradora: Claire Powell | Tradutora: Ana Rita Mendes
Editora: Nuvem de Letras | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 452
Resenhista: Dora Batalim
A saga continua, e as aventuras da Família Swift prosseguem. Mais um livro bem escrito e graficamente elegante. É o número dois da coleção, que deixa apetite para o número… três.
Livro juvenil, com ilustrações pontuais apropriadas e expressivas a preto e branco, proporciona horas de boa leitura. Texto fluente, vocabulário rico, tradução cuidada. De peripécia em peripécia, de membro da família em membro da família, seguimos a história e pensamos sobre as palavras. Depois da reunião de família, apanhado o assassino, Tropelia Swift volta a procurar o tesouro desaparecido. Os problemas não tardam. Um grupo de ladrões rouba um quadro valioso da casa dos Swifts – a sua perseguição irá até Paris. Uma nova aventura, movimentada e divertida.
Palavras-chave: identidade, família, policial, jogos de palavras, aventuras.
Imagem-chave: páginas 124 e 125

STOP
Escritor: Ricardo Henriques | Ilustrador: Pierre Pratt
Editora: Orfeu Negro | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 44
Resenhista: Sara Reis da Silva
Existem profissões (melhor dizendo, existiram profissões) certamente desconhecidas para os mais jovens. A sua evocação literária representa uma bela forma de não se perderem na memória dos tempos. Este livro-álbum é um original e divertido exercício precisamente neste sentido. Quem se lembra do polícia-sinaleiro? Quem sabe o que aconteceu aos polícias-sinaleiros? Na verdade, conhecer o agente Simões e o seu percurso de vida, aqui, neste volume, é descobrir muito da vida destas figuras outrora tão relevantes no trânsito citadino. Com uma abertura muito original e envolvente, o fio da narrativa desenrola-se a partir do referido protagonista, sempre representado em contextos e/ou espaços físicos repletos de humanos, diferentes humanos, a deslocarem-se, a vestirem-se, a manifestarem-se, etc. de forma muito distinta. Aliás, este é um livro que prima pela diversidade a vários títulos, estimulando a imaginação e convidando a efabular. Para tal, muito contribui o registo pictórico, em dupla página e evidenciando uma especial agilidade do traço, linhas próximas do caricatural e predomínio do sinal contorno, valorização de detalhes visuais (que podem afinar o olhar do leitor, despertar a curiosidade, prender a atenção ou favorecer a concentração), jogo de perspectivas e de dimensões e, ainda, a inclusão de texto intraicónico a dotar o relato de diversas subtilezas humorísticas, entre outras.
Palavras-chave: profissões, cidade, memória, humor, maravilhoso.
Imagem-chave: páginas 14 e 15

Tartaruga
Escritora: Ángela Cuartas | Ilustrador: Dipacho | Tradutora: Andreia Salgueiro
Editora: Alfarroba | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 44
Resenhista: Margarida Costa
Parece um livro sobre tartarugas, mas este é um livro sobre memória. Começa, paradoxalmente, com uma alusão contrária: “Eu não me lembro do meu avô, mas lembro-me das tartarugas”. E continua “Éramos grandes amigos, o meu avô, as tartarugas e eu, mas só me lembro das tartarugas”. A autora e o ilustrador utilizam como estratégia narrativa um diálogo profundo, verbal e visual, na qual uma listagem quase exaustiva das características, tipos, comportamentos das tartarugas, evoca e convoca os sentidos. O texto (confessadamente autobiográfico) é poético, marcado por um compasso lento, com as palavras e as ilustrações, só aparentemente infantis, a marcar o ritmo da leitura e as similaridades entre velhos e tartarugas. A terna lembrança do avô com “olhos de tartaruga, rugas de tartaruga e modos de tartaruga” é revelada ao leitor de forma intencionalmente demorada. No seu desenlace confirmamos que este é, afinal, um livro sobre memória afetiva, recordações evocadas pelo ativar de sensações, associadas a emoções e sentimentos específicos, neste caso o luto e a sua superação. É também um projeto gráfico cuidadosamente pensado, no formato do livro, na utilização do contraste do fundo branco/preto e no jogo de página simples/página dupla.
Obs.: Prémio Fundación Cuatrogatos 2023.
Palavras-chave: memória, luto, perda, saudade, sentidos.
Imagem-chave: páginas 4 e 5

Todos Viajam
Escritora: Kristin Roskifte | Ilustradora: Kristin Roskifte | Tradutor: João Reis | Projeto Gráfico: Svein Storksen
Editora: Liliput | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 68
Resenhista: Rita Pimenta
Depois de Todos Contam, Kristin Roskifte volta a pôr-nos a pensar nas diferenças e similitudes entre as pessoas, independentemente da sua origem geográfica, social ou religiosa. Que isso não nos afaste ou provoque conflitos dramáticos, como aqueles a que hoje assistimos. Precisamos mesmo de nos unir, local e globalmente.
Uma celebração da empatia, conexão e diversidade humana. (Pessoas de todo o mundo, uni-vos!)
Neste livro, mantém-se a lógica do anterior, a que também podemos chamar “fórmula”. De novo, a autora norueguesa alia o raciocínio matemático à literacia. Não há aqui propriamente uma narrativa, mas um desenrolar de cenários e ideias com a viagem como denominador comum. Concretizada, ansiada ou apenas vivida na imaginação. O certo é que inclui toda a gente, mais uma vez.
Se no geral se remete para viagens felizes e se mantém o sentido de humor, também se fala de sem-abrigo, se mostram pessoas com deficiência e se invoca a tristeza de viver distante de quem se ama.
Número redondo, 10.000: “Dez mil pessoas reunidas numa celebração pública. Estão a festejar um feito importante que traz consigo a esperança de um futuro melhor para a humanidade e para toda a vida na Terra.” Quem dera.
(Excerto/adaptação do texto divulgado no Público “Precisamos mesmo de nos unir, a 28 de Setembro de 2024.)
Obs.: A presente tradução obteve o apoio financeiro do NORLA – Norwegian Literature Abroad.
Palavras-chave: viagem, descoberta, diferença, mundo, humanidade, geografia.
Imagem-chave: páginas 22 e 23

Um Coração, Dois Caminhos: Diário de Uma (Pré)Adolescente
Escritora: Nora Dasnes | Ilustradora: Nora Dasnes | Tradutor: João Reis | Letra manuscrita por Ágata Ventura
Editora: Nuvem de Letras | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 256
Resenhista: Paula Cusati
Prestes a iniciar o 7º ano, Tuva começa um diário onde estabelece alguns objetivos que espera alcançar: escrever um diário até ao fim; ter um estilo “fixe”, entre outros. Porém, este ano revelar-se-á bem complicado e a transição entre infância e adolescência uma montanha-russa.
Num diário gráfico escrito e desenhado à mão, com as imperfeições e os riscos dessa forma de (auto)expressão, o que lhe confere genuinidade, a autora norueguesa, num bom ritmo narrativo icónico e textual, consegue contar, com humor q.b., as dores de crescimento (e não só) de uma rapariga que tenta desesperadamente perceber quem é e onde pertence, ao mesmo tempo que descobre o primeiro amor. Sem lições de moral, deixará, certamente, os jovens leitores a pensar acerca de temáticas como as relações familiares, os grupos, as redes sociais ou a auto-imagem.
Obs.: Premiado com o Ministry of Culture’s Graphic Novel Prize, o Pondus Prize e o Nordic Council Literary Prize. Finalista no Festival de Angoulême. A presente tradução obteve o apoio financeiro do NORLA – Norwegian Literature Abroad.
Palavras-chave: crescimento, identidade, amizade, pertença, redes sociais, LGBTQIA+.
Imagem-chave: páginas 86 e 87

Um Tigre no Hotel
Escritor: Sam Sharland | Ilustrador: Sam Sharland | Tradutora: Lara Xavier
Editora: Nuvem de Letras | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 36
Resenhista: Dora Batalim
Este livro combina narrativa visual e textual para contar a história de um pequeno hotel que passa por uma transformação incomum: de um espaço destinado a humanos a um refúgio para animais. A autora, com formação em ilustração de arquitetura, dá atenção especial aos espaços construídos, que aqui são representados com personalidade própria e funcionam como parte ativa da narrativa.
A história acompanha Elsie e a sua mãe, que gerem o hotel. Com a chegada de um tigre como hóspede, inicia-se uma mudança gradual no ambiente e na rotina do local. Ao longo do livro, o tigre vai ajudando discretamente nas tarefas diárias — ações súbtis que podem ser descobertas nas ilustrações, incentivando uma leitura atenta da imagem, para além das palavras.
Um dos elementos visuais mais interessantes são as guardas do livro, pois apresentam, de forma gráfica, o interior do hotel antes e depois da mudança. Essa transição visual complementa o enredo e reforça os temas do livro, como a convivência entre diferentes e a adaptação às transformações. A presença de muitos sinais e letreiros nas ilustrações acrescenta outra camada de leitura e contribui para a construção do ambiente narrativo.
O título em português, Um Tigre no Hotel, antecipa um dos elementos principais da história, o que pode reduzir o efeito de descoberta gradual presente no original, “Valentine’s Guest House”. Uma tradução mais próxima poderia preservar esse ritmo narrativo e manter o foco inicial no hotel, que tem um papel central na história.
O livro propõe uma abordagem acessível de temas como diversidade, inclusão e acolhimento. A combinação entre o traço arquitetónico das ilustrações e a atenção aos pequenos gestos das personagens oferece múltiplas possibilidades de leitura, tanto visuais quanto narrativas. O recurso a cores fortes imprime uma expressividade que ajuda a recordar este livro de forma feliz.
Palavras-chave: inclusão, diversidade, animais, hotel, hospitalidade.
Imagem-chave: páginas 36+seguinte (guardas finais)

Vem Aí o Lobo!
Escritora: Émile Jadoul | Ilustradora: Émile Jadoul | Tradutora: Helena Cruz Ventura
Editora: The Poets and Dragons Society | Ano de publicação: 2024 | N.º de páginas: 20
Resenhista: Iêda Alcântara
Quem tem medo do lobo?
Por ser mau, o lobo causa medo a toda a gente. Será?
Histórias sobre o lobo mau fazem parte do imaginário infantil. As crianças, temerosas, estão sempre à espera do momento em que o lobo feroz e ameaçador mostre as suas garras e coma a avozinha, os três porquinhos…
Este livro, com o seu tom divertido e abordagem leve, pertence ao género que subverte o medo típico do lobo e convida as crianças a reavaliarem essa figura clássica dos contos tradicionais, olhando para além dos estereótipos e descobrindo uma outra versão daquele que aparenta ser muitas vezes assustador. O enredo, apresentado com simplicidade e humor, surpreende no final com a quebra do estereótipo do lobo “vilão”.
As ilustrações expressivas, combinadas com linhas de contornos fortes, são ideais para envolver e transmitir emoções. A escolha por formas simples, com poucos detalhes, capta a atenção e permite que os leitores mais novos acompanhem a história visualmente de forma intuitiva.
Ao explorar o conceito de medo de forma leve, esta é uma leitura excelente para desenvolver na criança uma compreensão mais equilibrada sobre o que significa ter medo e como enfrentá-lo. Afinal, aquilo que tememos pode não ser tão assustador quanto parece…
Palavras-chave: medo, empatia, amizade, surpresa, estereótipo.
Imagem-chave: páginas 2 e 3
Selo Brasil 2024
A COLHER
A GIGANTESCA PEQUENA COISA
A JENNIFER CHAN NÃO ESTÁ SOZINHA
AGORA E PARA SEMPRE
AS GALOCHAS VERMELHAS
AS HISTÓRIAS QUE A AVÓ ESQUECEU (E COMO EU AS DESCOBRI)
BASHSHAR, O GUARDADOR DE PÁSSAROS
CAPUCHINHO VERMELHO
CARTAS FELIZES
CASA DE FAMÍLIA
DEUSES E HERÓIS DA MITOLOGIA GREGA
ESTA ÁRVORE É MINHA (NÃO TE APROXIMES)
EU SOU UM TIGRE
JULIETA PIRUETA
MUITO SERRA A SERRA DA ESTRELA
O JARDIM DA MINHA AVÓ
O MISTERIOSO GIGANTE
O PRIMEIRO NATAL DO PAI NATAL
O QUE VÊS QUANDO OLHAS PARA UMA ÁRVORE?
OS SWIFTS: UMA GALERIA DE PATIFES
STOP
TARTARUGA
TODOS VIAJAM
UM CORAÇÃO, DOIS CAMINHOS: DIÁRIO DE UMA (PRÉ)ADOLESCENTE
UM TIGRE NO HOTEL
VEM AÍ O LOBO!
N.B.
– Em cada um dos textos anteriores, foi respeitada a opção do autor, relativamente à utilização do Acordo Ortográfico.
– A apresentação dos livros no Site obedece a uma opção estética, não havendo ordenação por nenhum critério de avaliação.